O ano 1982!
O melhor filme de todos os tempos era lançado! Baseado no genial
livro de Phillip K Dick - "Os Andróides sonham com carneiros
artificiais?" Livro e filme extremamente conceituais.
Richard Deckard (Harrison Ford) é um ex-caçador de andróides
que se 'aposenta' da profissão de blade runner (mais à
frente explico a origem do nome Blade, que soa até estranho para
designar um caçador de andróides, mas só entendendo
o livro exatamente anterior a este do mesmo K Dick, para compreender
melhor o termo), mas é procurado por Gaff para voltar ao exercício,
pois seis unidades Nexus 6 haviam fugido de um planeta distante. Um policial
invejoso, que sonha com o cargo de Deckard, e se mostra sombrio durante
todo o filme, a vontade é de contar cada cena é gigante, após
a 1001ª vez que a gente assiste ao filme, mas vou tentar resumir...
Com o avanço da engenharia genética, réplicas quase iguais ao seres
humanos, foram criadas para desempenhar trabalhos mais duros, extração
de minérios em planetas colonizados etc. Os replicantes eram mais fortes
e tão inteligentes quanto os engenheiros genéticos que projetaram seus
cérebros. Até aí perfeito! Mas começaram a perceber que,
com o tempo, eles começavam a adquirir sentimentos, sendo capazes de sentir, amor, ódio,
tristeza, alegria.
Então criaram um 'dispositivo de segurança', os andróides foram criados
para viver apenas 4 anos, o que não daria tempo de crescer emocionalmente.
Fator que causa uma revolta em alguns replicantes, que sequestram
uma nave e voltam à Terra, para saber e controlar sua longevidade e
morfologia. Roy Batty (Rutger Hauer) é o líder deles, e protagonista
de cenas inesquecíveis, como no ápice do filme (sem contar o final),
Rachel é o enlace amoroso do filme, no seu affair com o caçador de andróides,
Deckard, ela recebeu um implante de cérebro, e a tecnologia tão avançada
que ela mesma não sabia que era uma replicante. "Mais humano do que
um humano", era o lema da Tyrell Corporation.
E aí é que está o grande enigma da primeira versão, gerou enormes discussões,
seria Deckard um andróide, durante 10 anos esse foi o foco da discussão
sobre o filme, mais enigmático do que a suposta traição em Dom Casmurro, impecável livro de Machado de Assis. Finalmente em 1992, o genial
diretor Ridley Scott, conseguiu levar ao cinema a versão original do
filme, que havia sido cortada e alterada pela WB.
Recuperando o filme original, sem os pensamentos e com algumas das cenas
cortadas (há outras três cenas cortadas que não foram ao ar em nenhuma
das versões, porque segundo Ridley não faziam diferença no filme, uma
delas é quando Deckard visita Holden no hospital - o outro caçador de
andróides, alvejado por Léon quando realizava o teste de empatia - uma
cena forte e que realmente não acrescentaria nada à trama), a cena principal
estava lá, Deckard sonhando com o unicórnio, o que prova sua condição
andróide. Também era uma experiência como a de Rachel, embora não saiba. Genial! Mas não pára por aí.
Por que um filme futurista sobre andróides e engenharia genética
(assunto preferido de algumas bandas geniais da época como Heaven
17, OMD e até Skinny Puppy e Front Line Assembly), conseguiu
mostrar tanto sobre o comportamento dos próprios seres humanos?
Porque simplesmente, se houvesse um teste de empatia no congresso nacional
por exemplo, a conclusão poderia ser que quase todos não passariam
no teste, máfia das sanguessugas roubando dinheiro até de ambulância
enquanto milhares de pessoas morrem nos hospitais públicos brasileiros
ou por falta de atendimento, mensalão de 30 mil por mês para votar contra
a população que já passa fome, com certeza os deputados brasileiros
não passariam na Voight-Kampf
Mas o que tem em Blade Runner, o cult movie mais adorado de todos os
tempos? O filme choca? Claro, mas ao mesmo tempo é intrigante, conquistador,
apaixonante, genial, e infelizmente, em muitos momentos se mostrando
realista. A história se passa em Los Angeles de 2019, uma economia dominada
pelas grandes empresas, a economia oriental em todas as partes da cidade,
como acontece desde os anos 80 nos EUA. Blade Runner acima de tudo,
é um alerta à humanidade, muito além de um filme de ficção, o importante
é a essência dele, mostrar ao mundo a que ponto a falta de empatia pode
diferenciar os humanos dos andróides, mas se até os andróides aprendem
a ter sentimentos e poupar uma vida, por amor à ela mesma, porque um
ser humano é o único animal que sente prazer em matar? Froyd? Também,
uma mistura de Isaac Asimov, Froyd e principalmente a genialidade de
Phillip K Dick, com perfil de Ridley Scott.
Esperemos que o relançamento do DVD (talvez com as duas versões)
traga também as cenas deletadas e ao menos entrevistas com o
diretor.
FICHA
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"Blade
Runner - O Caçador de Andróides"
Título original: "Blade Runner"
EUA, 1982, 118 minutos.
Harrison Ford - Deckard (Narrador)
Rutger Hauer - Roy Batty
Sean Young - Rachael
Edward James Olmos - Gaff
M. Emmet Walsh - Capitão Byrant
Daryl Hannah - Pris
Willian Sanderson - J.F. Sebastian
Brion James - Leon
Joel Turkell - Tyrell
Scott Colomby - Brian Schwartz
Joanna Cassidy - Zhora
James Hong - Hannibal Crew
Morgan Paul - Holden
Direção: Ridley Scott
Produção: Michael Deeley
Roteiro: Hampton Francher e David Webb Peoples,
baseado em livro de Philip K. Dirk
Música: Vangelis
Fotografia: Jordan Cronenweth
Desenho de Produção: Peter J. Hampton
e Lawrence G. Paull
Figurino : Michael Kaplan e Charles Knode
Edição: Marsha Nakashima
Estúdio: The Ladd Company
Distribuição: Columbia TriStar
/ Warner Bros.
Genêro: Ficção |
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Ao lado cena de Blade Runner e os carros aéreos, usado
já em flyers do autobahn. O genial grego Vangelis é mais o responsável
pela trilha sonora do filme, mas só foi vendida a orquestrada à época,
o CD dele mesmo sobre o filme só saiu em 92 no relançamento do filme
com a nova versão. Na trilha podemos ouvir samples de cenas do filme.
Na trilha Vangelis mostra uma vez mais, a capacidade sentimental da
música eletrônica, perfeita, não poderia ser outra trilha, as máquinas
produzem sentimentos ou como diz Ralf Hutter do Kraftwerk "Nós
tocamos as máquinas e elas nos tocam", a capacidade inigualável
da música eletrônica de transmitir e receber sentimentos.
Como diria uma grande amigo meu "quem acha que música eletrônica é fria
é porque nunca ouviu Gary Numan e Soft Cell", eu incluiria OMD e Vangelis,
sem dúvida. As versões: No dia de lançamento do cinema, estava eu lá
em plena Avenida Paulista, em uma fila gigante, esperando a hora sonhada
de ver a verdadeira versão do filme, cortada 10 anos antes... indescritível
a sensação de realização... de ver um desfecho completamente diferente
do original, com mudança de apenas duas cenas de menos de um minuto
cada, e claro a voz da consciência de Deckard inseridos forçosamente
na primeira versão havia desaparecido.
Vale a pena assistir 100 vezes o filme e pegar cada detalhe, genial.
Na primeira versão, os pensamentos foram inseridos para dar uma cara
humana ao Deckard: "sentimentos num caçador de andróides",
exatamente nessa frase fica mais lógico o filme e o unicórnio que só
aparece em seu sonho na segunda versão, essa é a grande sacada do autor
do livro, Phillip K. Dick. Era para distanciar a idéia original do filme,
cortado pela Warner Bros, de que ele é um andróide.
Além do corte da cena do unicórnio, os pensamentos de Deckard foram
inseridos após o filme ter ficado pronto pelas mãos do diretor, para
não ter que rodar novamente todo o filme, a WB gravou apenas a voz de
Harrison Ford sobre o filme, em forma de pensamentos e reflexões, o
que dava uma memória a Deckard, se ele tinha memória, da sua ex-mulher
(logo no começo do filme que o apelidara de Sushi) e refletia tanto
sobre a vida, ou sobre atirar em uma mulher pelas costas, afastava as
desconfianças de que ele fosse um andróide, e assim a versão que foi
para as telonas foi a da Warner (com os pensamentos inseridos forçosamente
e o corte da cena do unicórnio). Mas felizmente Ridley Scott conseguiu,
apenas 10 anos depois é verdade, levar a sua versão original aos cinemas,
sem os pensamentos inseridos depois (embora maravilhosos) e com a cena
do unicórnio. E claro sem o happy-end armado pela WB, que não combinava
em nada com um filme inteligente.
E para variar, a recomendação: assistam ambas as versões.
Mil vezes se for necessário (eu já assisti algumas centenas de vezes
e aindo me delicio a cada sessão)
Trecho de Blade Runner que reforça que Richard Deckard
também é um andróide. Logo depois dessa pergunta de Rachel, ela fica
olhando as fotos que colocaram para Deckard ter "memórias",
e ainda mais a música, a partitura que ele tem uma lembrança vaga, ela
tocando, essas sequências de cenas ajudam a comprovar que Deckard é
realmente um replicante.
A comparação entre os sentimentos, ser humanos ou replicantes o mito,
'de onde viemos, para onde vamos, quanto tempo temos', é o que andróides
no filme e é o que nós humanos fazemos na vida real.
"Aquele
seu teste Voigt-Kampf? Você já o usou em você mesmo?"
E agora, o absurdo do porquê a versão do diretor ter
sido cortada, nas palavras de Sean Young (Rachel):
"A visão
original do diretor foi relançada em 92, mas houve problemas que o impediram
de lançar aquela versão (em 1982)."
"Nós sabíamos disso [Deckard ser um replicante] todo o tempo. Essa
era a idéia original, mas eles não aceitaram a versão daquele jeito
porque o estúdio disse que o herói não poderia não ser humano."
"Ridley Scott queria que Deckard fosse um replicante que não soubesse
que o era, mas foi recusado porque o pessoal do estúdio disse que o
herói tinha que ser humano."
Trailer
da versão do diretor
Deckard
sonhando com o unicórnio - cena cortada da versão do diretor original
É o filme que mais tem trechos a serem citados, o filme mais sampleado da história. Até 1993, 49 bandas
haviam sampleado o filme, de Sigue Sigue Sputnik e Gary Numan a Bomb
the Bass, aliás sempre ouvimos esses samples, por exemplo uma
das músicas do Sigue Sigue, Love Missile F1-11, toco quase toda
semana no Autobahn e o sample do filme repetido várias vezes.
No livro é mais claro, não existem mais animais, por isso,
o nome do livro, após a terceira guerra mundial, não haveriam
muitos humanos e os animais teriam sido extintos quase por completo.
Blade Runner foi um dos maiores alertas para a sociedade sobre sua forma
de viver.
Para um filme cult, aquilo estava mesmo muito "final feliz",
não seria a sequência natural de filme inteligente, era
adaptado.
A sequência lógica era o desenvolvimento pela própria
Rachel, e pelo livro anterior (embora o filme tenha sido rodado após
Blade Runner) na verdade após Blade Runner, vários livros
dele viraram filmes, todo mundo queria filmar K Dick, Hollywood, virava
uma fábrica de filmes do gênio K Dick, mas nenhum obteve
o sucesso de Blade Runner, Screamers, onde começava com uma lâmina (Blade) giratória,
depois essas máquinas foram assumindo formas mais humanas, não
dá para contar o final.
Replicantes:
Roy Batty: N6MAA10816 (Nexus-6, Masculino, Nível
físico A, Nível mental A, Data de fabricação
1/08/16). |
Pris: N6FAB21416 (Nexus-6, Feminino, Nível
físico A, Nível mental B, Data de fabricação
2/14/16). |
Zhora: N6FAB61216 (Nexus-6, Feminino, Nível
físico A, Nível mental B, Data de fabricação
6/12/16). |
Leon: N6MAC41717 (Nexus-6, Masculino, Nível
físico A, Nível mental C, Data de fabricação
4/17/17) |
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Curiosidades:
- Por que Blade Runner é considerado
até o filme mais conceitual da história?
- Por que a febre Blade Runner nos 80, foi tão grande e até
maior do que Matrix nos 90?
- Blade Runner é até
hoje, o filme mais sampleado da história do cinema. 148 falas
do filme foram usadas em músicas ... 148!!! 148 trechos usados
em 71 músicas. 49 bandas usaram em algumas de suas músicas,
samples de Blade Runner Só o Sigue Sigue Sputnik (banda futurista
de meados dos anos 80) usa em 3 músicas. Gary Numan, o gênio
futurista do final dos 70 e começo dos 80, o primeiro músico
a usar sampler na história, usa trechos de Blade Runner em
quatro de suas músicas, incluindo a maravilhosa Down in the
Park. A lista passa por Bomb the Bass, Pop Will Eat Itself, e chega
até os 90, quando bandas como o EMF, uma banda de garotos que
não tinham mais de 8 anos à época do lançamento
do filme, sampleiam Blade Runner.
- O filme inspirou até a propaganda
de Pomarola (um famoso molho de tomate brasileiro, o que na época
o tornou o mais vendido do país, graças à propaganda
baseada em Rachel do filme Blade Runner): Um mulher com o rosto, cabelo
e visual idênticos ao da personagem do filme, indica pomarola
como o molho de tomate mais avançado, que veio do futuro para
facilitar a vida, já vinha espremido, coado e temperado, realmente
algo do futuro para aquele momento, e escolheram mais em voga na humanidade,
sem saber que anos depois, seria escolhido como o melhor dos anos
80, após Rachel indicar Pomarola, a cena vai aproximando da
lata, exatamente como o computador de Deckard no filme, quando ele
pede para aproximar os pontos na foto, 'direita aproxima 45, centralizar'.
A empresa responsável pelo comercial usou até samples
do barulhinho do computador de Deckard enquanto aproximava, e para
repetir a sequência do filme, depois 'o computador' na tela
do espectador aproxima da marca, na parte debaixo da lata, . Perfeito!
- Analisando o número da Pris (Daryl Hannah): N(Nexus) 6 F
(sexo feminino) A (nível físico A aparece na ficha dela
durante o filme, por isso concluo que seja isso, combina perfeitamente
com a ficha) B (nível mental B, o mesmo) 21416 (Data de fabricação,
no inglês é ao contrário, o mês depois o
dia e por último o ano, 14 de fevereiro de 2016 - 14/2/2016
em inglês 2/14/16, que é o final da sequência).
-O filme gerou inclusive vários games. Alguns deles para PC
No livro, Deckard tem uma máquina/sintetizador, que emite sequências
de sons que alterariam o animo da pessoa, quando ele queria ficar
tranquilo, apertava uma tecla que emitia uma sequência sonora
que o deixava mais calmo, quando queria ser convincente, outra tecla,
no meio de uma discussão outra sequência, isso foi tirado
do filme, mas no livro me empolguei bastante com a idéia, pouco
depois descobri que a banda Heaven 17, genial braço do Human
League, que seguiu uma linha mais experimental, formou a British Electric
Foundation, pouco depois de Martin Ware e Ian Marsh, deixarem o Human
League, enquanto compunham as músicas do Heaven 17, tiraram
uma licença da gravadora, para pesquisar e desenvolver essa
máquina usada pelo Blade Runner, anos e anos se passaram estudando
o efeito dos sons na mente humana. Genial! Infelizmente a conclusão
foi desanimadora, poderia parecer um pouco óbvia, mas para
geniais cientistas da música, nada é impossível
até a última alternativa deve ser esgotada.
Esse é o motor dos grandes inventos da humanidade. Após
5 anos parados com o Heaven 17, e aprofundados em suas pesquisas no
BEF, os geniais programadores descobriram que o efeito variava muitíssimo
de um ser humano para o outro, e o que o livro previa realmente era
impossível, ao menos para a tecnologia que tínhamos
na época da pesquisa. Aliás o nome da própria
banda, já é de um filme futurista, Heaven 17 é
baseado num nome de banda fictícia de Laranja Mecânica
quando Alex está na loja comprando discos.
-Falando em nomes, Blade Runner, inspirou
inclusive vários nomes de bandas, entre eles, os Replicantes
(Surfista Calhorda), Nexus 6 (banda technopop que fiz parte da formação
na época), entre dezenas de outras. Inspirou músicas
como Headhunter, maior sucesso do Front 242 de todos os tempos, Nitzer
Ebb (um som industrial extremamente futurista) e Gary Numan, mas no
caso do Gary Numan, seus primeiros álbuns que falam mais replicantes,
inclusive o álbum Replicas de 80, foram feitos antes do filme.
-Mas como, perguntaria alguém?
Gary Numan é fortemente influenciado pelo Phillip K Dick, a
sua influência vem diretamente do livro, e depois do filme,
usou samples, mantendo sempre em mente as letras futuristas e geniais
de seus álbuns. Gary Numan? É o Blade Runner da música!
Mas Human League também. Heaven 17, Depeche Mode, OMD, New
Order, é impossível citar apenas uma banda que tenha
continuado a história de Blade Runner, com tantas bandas maravilhosas
seguidoras do filme, havia alguma necessidade de continuação?
Marcos Vicente
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