No dia 26 de julho de 1928, em Nova York, mais especificamente no bairro do Bronx, nascia Stanley Kubrick, certamente um dos cineastas mais importantes e influentes do século XX. Apesar das produções que o catapultaram como um dos maiores ícones da Sétima Arte terem sido realizadas na década de 1970, a linguagem revolucionária e a forte identidade impressa nas obras influenciaram significativamente a década seguinte e não apenas no Cinema, mas também na música, na literatura e na Cultura Pop.
A paixão de Kubrick pela imagem nasceu muito antes de realizar seu primeiro filme. Aos 13 anos, foi presenteado com uma câmera fotográfica pelo seu pai e não deu outra: amor à primeira vista! Nesse período, o jovem Stanley não tinha na vida escolar o mesmo sucesso que teria futuramente como cineasta, era um aluno negligente e por muitas vezes, matava as aulas para ir ao cinema e fotografar. Ainda assim, o tempo que passou longe das salas de aula não foi vão, pois não demorou para que seu talento na fotografia fosse logo reconhecido. Kubrick, ainda muito jovem, teve muitos de seus trabalhos publicados na revista “Look”. Depois disso, o jovem nova-iorquino imergiu completamente na sua paixão pela Sétima Arte, pesquisando tudo o que podia sobre cinema em qualquer fonte bibliográfica que encontrasse e visitando pessoalmente diversos laboratórios de revelação e tratamento de películas. Tudo isso deu fruto no ano de 1951 quando, muito influenciado por Sergei Eisenstein – pai da edição moderna- Stanley Kubrick dá a luz ao seu primeiro trabalho no cinema propriamente dito, o curta metragem “Day of the Fight”, em 1951, onde já podemos encontrar uma identidade muito forte que estaria presente em seus trabalhos vindouros. Ainda em 1951, largamente influenciado pelo consagrado filme soviético de Eisenstein, “O encouraçado Pontemkim”, o ainda jovem aspirante a cineasta lança seu segundo curta-metragem, “Flying Padre”, que assim como na sua produção seguinte, “The Seafarers”, em 1953, já evidencia o caráter detalhista e perfeccionista que pode ser observado em toda a sua obra.
Ainda no ano de 1953 e com o apoio financeiro de amigos e familiares, Stanley Kubrick dirige seu primeiro longa-metragem, “Medo e Desejo”. O filme foi muito aclamado pela crítica e agradou muito aos cinéfilos a maneira como o diretor conseguiu retratar o lado obscuro do ser humano com uma linguagem cinematográfica tão complexa e inovadora, mesmo com recursos tão escassos. Apesar disso, Kubrick jamais gostou do filme e até promoveu uma campanha para tira-lo de circulação. Dois anos depois lançaria seu segundo longa metragem, “A Morte Passou Perto” (1955), e a maneira vanguardista de fazer cinema presente nesta produção, que conta a história de uma garota vítima de abuso que é salva por um lutador, chama logo a atenção de um grande produtor de Hollywood, James Harry. Fato este que foi o trampolim para que Stanley Kubrick se inserisse no maisntream da grande indústria cinematográfica.
Em 1956, o então iniciante cineasta nascido no Bronx tem a primeira oportunidade de realizar uma produção com um orçamento mais profissional em “O Grande Golpe” e, a estrutura não linear e a precisão técnica, provam que o investimento foi bem gasto. Apesar do filme não ter sido um apogeu de bilheteria para a indústria, foi um grande marco no cinema e influencia outros grandes cineastas, como Quentin Tarantino, por exemplo, até hoje. No ano seguinte, cai nas mãos de Kubrick o trabalho de realizar a adaptação do livro “aGlória Feita de Sangue” de Humphrey Cobb. O filme homônimo marcou a carreira do cineasta como sendo o seu primeiro sucesso comercial. Apesar de não poupar nos recursos gráficos para retratar as cenas de violência da “I Guerra Mundial”, Kubrick conseguiu compor cenas grandiosas de batalha sem perder a dramaticidade. Kirk Douglas, que protagonizou o filme, durante as filmagens desenvolveu uma grande admiração pelo trabalho do diretor a ponto de convidá-lo, em 1960, para dirigir um filme que produziria, “Spartacus”, que também foi um grande sucesso de público e crítica, conquistando quatro prêmios da academia.
Em 1962, no seu filme seguinte, “Lolita”, adaptado do livro homônimo de Vladimir Nabocov, Kubrick, já detendo certo prestígio, começa a demonstrar uma identidade um tanto divergente daquela que se observava nos seus trabalhos anteriores que se imprimiria muito contundente nas suas produções vindouras.. Abre mão da dramaticidade existencialista dos personagens e passa a trata-los de forma mais satírica e ácida, característica essa que transbordou no seu trabalho seguinte, “Doutor Fantástico” (1964), que lhe rendeu a primeira indicação ao Oscar como melhor diretor.
Stanley Kubrick, como foi mencionado, fora largamente influenciado por um dos grandes gênios do Cinema, Sergei Eisenstein, no entanto, no seu trabalho seguinte, Kubrick escreveria indelevelmente seu nome na história do cinema ao lado do seu ídolo soviético. Em 1968, após cinco anos entre pré-produção e lançamento, a Sétima Arte era presenteada com um dos melhores filmes já feitos, “2001 – Uma Odisseia no Espaço”. Com uma linguagem revolucionária e efeitos especiais jamais vistos e que impressionam muito, mesmo tendo se passado meio século, Kubrick transporta para a grande tela o drama e os questionamentos da existência humana confrontada com o progresso tecnológico de sua própria espécie. Quando foi lançado, o filme foi bombardeado pela crítica e não agradou ao público, o que analisando hoje é até compreensível, uma vez que o longa estava décadas à frente de seu tempo. Ainda precisaríamos de muitos anos de reflexão e desenvolvimento para vislumbrarmos a grandiosidade e a importância deste filme.
Em 1971, uma tendência muito predominante na indústria, fruto dos preceitos que compuseram a fase da “Nova Hollywood”, era uma exaltação romantizada e, até mesmo indulgente, da juventude. Neste cenário, Kubrick, como já esperado, opta por seguir na contramão. Em outro de seus filmes mais icônicos, “Laranja Mecânica”, o cineasta desconstrói de maneira muito perturbadora e incômoda, essa aureola conferida aos jovens. Passando-se numa Londres idealizada e distópica, os jovens retratados neste filme são perturbados, degenerados e, com permissão do termo, “ultra-violentos”. O humor ácido, a violência gratuita e a vulgaridade como os elementos são decupados neste filme, muito distantes da atmosfera onírica e reflexiva de “2001”, rendeu-lhe diversas críticas e forte censura através do mundo, no entanto, sua estética única, sua forte identidade e a maestria como os personagens são desenvolvidos na trama, tornam-no hoje uma obra fundamental para qualquer amante da Sétima Arte.
Em 1975 o diretor lança aquele filme que é tido por muitos como a sua obra mais autoral. Reaproximando-se das produções da gênese de sua carreira como “Glória feita de Sangue”, agora em Barry Lyndon, Kubrick brinda o público com o fruto de uma cuidadosa e detalhada pesquisa histórica e tão autêntica, que a iluminação de todo o filme é realizada com luz natural e velas. Para realizar essa produção, o cineasta dispensou a direção de “O Exorcista”, realizando seu primeiro filme de terror 5 anos depois, em 1980, quando adaptou a obra de Stephen King, “O Iluminado”. Apesar das duras críticas do autor e da polêmica em decorrência dos abusos cometidos com a atriz Shelley Duvall, o filme cria com maestria um ambiente assustador e desolado, que constantemente transmite ao público uma sensação constante de perigo.
Em 1987 Stanley Kubrick lança um filme sobre a guerra do Vietnã, “Nascido Para Matar”. Apesar deste tema já ter sido muito explorado pela indústria, o diretor evita cair em qualquer cliché estipulado ao gênero. Trabalhando de forma mais documental e expondo de uma maneira muito crua a deterioração psicológica sofrida pelos personagens numa ambiente de guerra, esta produção é aceita como uma das mais honestas já feitas sobre esse período histórico e como ele incidiu no comportamento e na mentalidade das pessoas que o vivenciaram.
O filme seguinte só foi lançado 12 anos depois, no final da década de 1990. “De Olhos Bem Fechados” (1999) encerra a carreira deste gênio do cinema. Flertando com o surrealismo e abusando de cenas incômodas, Kubrick trabalha o desenvolvimento psicológico dos personagens e o universo insólito no qual eles se inserem com grande maestria. Segundo o próprio diretor, este filme foi o que mais lhe agradou. Após dois anos para concluir essa obra, quatro dias depois de seu lançamento, no dia 7 de março de 1999 morre Stanley Kubrick vítima de um ataque cardíaco.
Stanley Kubrick foi um daqueles artistas tão únicos, que aparecem, no máximo, um por geração. O tempo entre um projeto e outro, além do longo tempo e trabalho duro dedicados a cada produção, atestam que o primeiro compromisso do cineasta era com a arte e não com a indústria. Kubrick pode não ter vivido para vislumbras o novo milênio, entretanto a sua criatividade, sua visão revolucionária e inquietação artística, por si sós, já atestam que ele vivia séculos à frente do tempo em que viveu.